data-filename="retriever" style="width: 100%;">A Rede Globo de Televisão comemorou recentemente, com pompa e circunstância, meio século de telejornalismo tendo à frente o seu principal veículo o Jornal Nacional (JN). Recebeu homenagem especial na Câmara dos Deputados, onde diversos parlamentares, certamente interessados em aparecer à noite na tela da TV, revezaram-se na tribuna para lembrar o grande feito e enaltecer as virtudes de seus idealizadores. O JN ganhou, inclusive, o prêmio Emmy Internacional em mais de uma ocasião. Remando em sentido contrário, arrisco-me a dar opinião sobre a história do JN.
Fiz as contas e cheguei à conclusão que o JN entrou no ar em 1969. Ano pouco aconselhável para começar um programa de notícias, já que o canal só poderia divulgar as notícias depois de passar pela censura, que ficara mais rigorosa. Não podemos esquecer que, desde o ano anterior, a ditadura militar apertara o cerco contra as liberdades democráticas, com a implantação do famigerado AI5. Qual o papel da Globo durante a ditadura militar senão o de porta-voz do regime? Pelo menos, essa era a contrapartida que se poderia esperar. Não quero com isso generalizar, nem dizer que não haviam jornalistas dispostos a resistir. Mas, provavelmente, essa não era a postura da cúpula da emissora.
Na campanha presidencial, o próprio Bolsonaro acusou a Globo de apoiar o golpe militar, criando uma situação constrangedora para o apresentador do JN. William Bonner respondeu que esse assunto era superado e que a emissora já teria pedido desculpas públicas. Será, neste caso, que arrependimento basta? Como se dissesse "águas passadas não movem moinho". Só quando a ditadura militar entrou em colapso a Globo passou a defender uma democracia liberal e o JN passou a ter o formato que tem hoje. Se, antes, o limite da notícia era o poder militar, hoje, é o poder econômico.
Existe uma relação perversa nesse trinômio Estado-empresa-jornal. Há uma cadeia de interesses, cujo ponto final é o jornal. No livro As palavras de Saramago, o escritor português explora essa questão: "É normal que o jornal se limite a informar, sem correr riscos. Quando se arrisca, está suficientemente protegido para dar a opinião que convém ao poder. Às vezes arrisca, se tem a expectativa de que o poder será substituído. É a aposta no governo seguinte".
Creio que a citação do parágrafo anterior se aplica ao JN. Não é preciso puxar muito pela memória para lembrar momentos em que a informação foi claramente manipulada para apoiar ou sujar a imagem de um candidato. A edição do debate de Lula com Collor, por exemplo, ficou como uma mancha que não pode ser apagada. Para não ir muito longe, recentemente, o jornalista Glenn Greenwald, editor do site The Intercept Brasil, denunciou o vazamento seletivo de informações exclusivas para a Rede Globo, por parte de integrantes da Operação Lava Jato, em troca da "blindagem" do ex-juiz Sérgio Moro. Será que a Globo já fez sua aposta para o governo seguinte?
O JN, para o bem ou para o mal, foi a verdadeira "voz do Brasil" nos últimos 50 anos. Mas o monopólio da TV Globo tem os seus dias contados, seja pela crescente participação das redes sociais, seja pela ameaça de concorrentes estrangeiras, ora em fase de instalação no país. Ao menos, ao não ceder à bajulação oportunista das outras redes nacionais ao bolsonarismo, a emissora sinaliza uma mudança positiva. O futuro dirá se essa notícia é fato ou fake?